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ENTREVISTA PARA SITE ‘COLHERADA CULTURAL’

10/fev/2011

 

1 - Como é para você expor uma individual pela primeira vez na cidade de São Paulo? Você acha que tem alguma diferença para as outras cidades do país?

Sim, pois é sem dúvida alguma, a cidade onde o circuito de arte é mais intenso, diversificado e atualizado. É, certamente, a cidade onde o trabalho tem mais repercussão.

 

2 - Porque a escolha da palavra Encapelado para intitular a exposição?

Encapelado é o título que dei para uma das obras expostas e se tornou também o título da exposição porque unifica as temáticas abordadas (elementos naturais ar e água às serpentes sobrenaturais). A palavra Encapelado tem 3 referências:

- de um mar em tempestade, revolto dize-se ‘mar encapelado’ ou ‘mar cavado’.

- capelo é a palavra que alude ao formato da cabeça da naja, também conhecida como cobra-de-capelo. Por ‘naja encapelada’, entende-se uma naja em situação de bote, pronta para atacar.

- sonoramente, em português, encapelado alude à palavra capela e, conseqüentemente, aos seus significados de templo, local religioso, de contemplação de algo maior do que nós mesmos.

Mas quero lembrar que minha exposição tem um segundo título: (ou Contenções) -  que se refere a elementos contidos/retidos/ congelados/ parados em seus movimentos e daí surge uma pergunta: o que nos contém, detém, pára, retém?... Todos os trabalhos  têm a ficção de algo que não podemos controlar, de uma entidade natural misteriosa cuja vontade desconhecemos, o que, em geral, nos provoca receio. Entendo como uma metáfora ou alusão a diversas situações às quais um indivíduo inevitavelmente vivencia.  

 

3 - Você não se prende a apenas uma forma de arte, você “brinca” com vídeos, livros, instalações e obras arquitetônicas. Você acha que isso traz mais diversidade a sua arte? Por quê?

Acho que a diversidade de que você fala já existe antes das diferenças entre as técnicas utilizadas. As técnicas são escolhidas em função da idéia, do pensamento visual que as obras expressam/representam. As idéias são amplas e sutis; e a variedade dos materiais, assim como a escala do trabalho, alude (evidencia e/ou representa) a estas sutilezas e peculiaridades.

 

4 - Por que a escolha de serpentes para ilustrar suas obras?

A serpente foi uma conseqüência, um caminho natural, um percurso visual que se tornou, inevitavelmente e a primeira vista, para quem não conhece a trajetória dos meus trabalhos, menos importante diante da força que tem a serpente enquanto símbolo. Por quase 5 anos eu realizei desenhos cuja espacialidade era criada pela estrutura dos corrimões dos ônibus circulares de São Paulo. Eram desenhos, ao mesmo tempo, duros e orgânicos. Marco Buti, Evandro Carlos Jardim e Cláudio Mubarac, meus professores, colocaram esta organicidade em questão e me presentearam, em nossas conversas de orientação, com desafios de desenho. Então eu passei a desenhar árvores sinuosas, araucárias, ondas de mar, serpentes e nuvens, enquanto também experimentava desenhar em escalas arquitetônicas em diversos projetos de intervenção. Em minha banca de conclusão da graduação na USP, apresentei um livro de gravuras reunindo imagens destes temas e o qual intitulei de “dos corrimões das serpentes das nuvens do mar”, Mubarac fez uma longa consideração sobre a Serpente Emplumada, divindade serpente dos maias e astecas, muito complexa e rica em significados, que é serpente e pássaro, a água e o ar, deus bélico e da fertilidade, tudo em uma só divindade. Neste momento meu interesse por lendas/mitologias/folclores envolvendo serpentes já estava bastante adiantado e intensifiquei minha pesquisa, inclusive viajando ao México para estudar in loco esta entidade misteriosa. A serpente é um ser muito rico em significados para diversas culturas do mundo. Também por isso ela se tornou um símbolo facilmente detectável em minhas obras e fica mais difícil perceber que meu trabalho fala de muitas outras temáticas através da serpente.

 

5 - O sobrenatural e a atmosfera fantástica são recorrentes em suas obras. Você sempre se interessou sobre esses assuntos? E quando eles foram realmente incorporados em seus trabalhos?

Estes assuntos estiveram presentes desde cedo em minha vida, por influência de meus pais, que sempre me contaram estórias misteriosas antes de dormir. Minha mãe é pedagoga e dá muita importância à tradição oral e aos contos-de-fada para a formação de uma criança. E meu pai me apresentou a boa literatura, as artes, o cinema e a música, sempre me incentivando com redações e poemas, desenhos e apresentações de teatro na escola. Considero que estas experiências me deixaram bastante conectada com isto que chamo de ‘lado mais poético da vida’ e que se refere mais ao conhecimento cognitivo. A preferência pelo sobrenatural e o fantástico foi algo que desenvolvi durante minha descoberta do desenho, conforme meus trabalhos foram tomando corpo. Acho que estes elementos estão presentes há mais tempo, mas foram de fato identificados, reconhecidos e assumidos de uma forma coesa somente há pouco mais de um ano.

 

6 - Você é natural de Minas Gerais, quais são os artistas de lá que você mais admira?

Confesso que conheço pouco os artistas mineiros contemporâneos, mas admiro demais a Ana Maria Tavares, a artista de quem sou assistente e que foi minha professora na faculdade (ECA-USP), apesar de que durante minha graduação tive pouco contato tanto com  a artista como com sua produção artística. Quando me formei e iniciei meu trabalho com a Ana é que pude conhecer toda a sua produção e, inclusive, perceber o quanto minha obra dialoga com a dela e também o quanto difere.

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